A filosofia é útil
Inicio este artigo partindo de duas ideias: a filosofia é útil e a filosofia é útil para os não filósofos. Por não filósofo entenda-se a pessoa que não fez uma licenciatura em filosofia, tal como eu.
Estas ideias estruturam o meu trabalho que consiste em levar a filosofia para espaços que habitualmente lhe estão vedados: o jardim de infância, a universidade sénior ou as equipas de uma empresa da área da farmacêutica.
Quando leio a obra das pessoas filósofas procuro encontrar ferramentas que possam ajudar-me a pensar melhor – e em última instância a ser uma pessoa melhor. Hoje partilho consigo duas ferramentas cartesianas que me chegaram através de um livro incrível da filósofa Marilena Chaui.
#1 verificar
Na sua investigação na área do conhecimento, Descartes sinalizou este erro comum, o de nos deixarmos conduzir pelas opiniões dos outros sem sequer verificar ou apurar da sua verdade. Duvidar do que os outros nos dizem é importante no processo de investigação ou mesmo no quotidiano.
Note que não se defende aqui um cepticismo extremo que nos faz duvidar de tal forma que temos de pensar tudo, todos os dias, como se fosse pela primeira vez.
Trata-se de uma dúvida em dose moderada, que devemos colocar em prática perante situações em que os preconceitos e outras ideias cristalizadas servem de bitola, impedindo a dúvida e um olhar novo.
#2 não ter pressa
A precipitação é algo que nos faz dizer isto ou aquilo sobre A ou sobre B sem sequer parar para verificar se a nossa opinião é verdadeira. Impera a vontade de dizer algo na hora, no momento, de dar a entender que se sabe, de manter uma postura de autoridade.
A pressa é inimiga do pensamento crítico. Um exemplo prático na comunicação: imagine dois interlocutores que conversam entre si e usam as mesmas palavras. Não conseguem entender-se, usam a mesma palavra, mas defendem ideias que parecem muito distantes.
Vamos pausar um pouco. Será que aquela palavra-chave que norteia a conversa está a ser usada da mesma forma, com o mesmo sentido?
Não tenha pressa para dizer se concorda ou não concorda, opte por perguntar: “pode dizer-me o que quer dizer com X?” Esclareça o ou os sentidos e continue a conversa a partir daí.
Ferramentas simples e que exigem esforço
As ferramentas são simples: verificar e pausar perante aquilo que os outros nos dizem e pausar perante aquilo que apressadamente queremos dizer. Porém, não estão isentas de esforço. O mundo à nossa volta é apressado e está constantemente a enviar-nos sinais (ou Call to Action) para que façamos algo, para que digamos algo.
Verificar e não ter pressa são duas atitudes que nos permitem falar com mais qualidade e em menor quantidade. Desta forma abrimos caminho para a prática do pensamento crítico e criativo, seja no contexto pessoal ou no contexto profissional.
Aceita o desafio cartesiano?
Referências:
- Chaui, M. (2019), Convite à Filosofia, São Paulo: Editora Ática
- Dicionário de Filosofia disponível via Crítica na Rede
Sobre a autora:
Joana Rita Sousa é filósofa e estratega digital. É mestre em gestão de recursos humanos e em filosofia para crianças. Trabalha na área da Filosofia Aplicada desde 2008, como formadora e consultora. É conhecida como a #joanadotwitter.
joana rita ponto EU: https://joanarita.eu/
É absolutamente maravilhoso esta forma de pensar a filosofia.Se no meu tempo , enquanto aluna tivesse tido esta oportunidade de aprender ,hoje sinto que muito teria aprendido.A relação teórica da filosofia com a prática deixa-me fascinada.Grata pela partilha e os conteúdos que aplica são extraordinariamente elucidativos!